Aditamentos Qualitativos e Quantitativos dos Contratos Administrativos e os Limites Legais

AutorMárcio Cammarosano
CargoDoutor em Direito Administrativo pela PUC-SP. Professor da graduação e pós-graduação ? mestrado e doutorado ? da PUC-SP. Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo
Páginas1-17

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N º. 18 – 2012 – Salvador – Bahia – Brasil

ADITAMENTOS QUALITATIVOS E QUANTITATIVOS DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS E OS LIMITES LEGAIS 1

Márcio Cammarosano

Doutor em Direito Administrativo pela PUC-SP. Professor da graduação e pós-graduação – mestrado e doutorado – da PUC-SP. Presidente do Instituto Brasileiro de Direito

Administrativo

O tema das alterações dos contratos administrativos submetidos ao regime jurídico da Lei nº 8.666, de 21.6.1993, é daqueles que ainda enseja divergências, especialmente em se considerando posições das entidades governamentais que os celebram e de órgãos integrantes do sistema de controle. Aquelas, com tendências mais acentuadas de interpretações que lhes assinalem atuação com maior desenvoltura, e estes, os órgãos de controle — sobretudo os de controle externo — professando orientação mais draconiana, postulando pela existência de limites mais estreitos de atuação governamental.

Desse tema voltamos a nos ocupar recentemente, proferindo exposição exatamente a respeito de alterações contratuais fundadas no art. 65, I, alíneas a e b da Lei nº 8.666/93, ao ensejo do Seminário Nacional de Direito Público, realizado em São Paulo do ano de 2007.

Refletindo uma vez mais a respeito da matéria, relendo o que escrevemos há dez anos,2e revisitando autores de nomeada, entendemos oportuno tecer novas considerações quanto aos limites estabelecidos no art. 65 da lei referida, em razão mesmo da gravidade das sanções cominadas para os que sejam tidos como violadores da ordem estabelecida.

1Publicado na Revista do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, n. 117, p. 35-43, fev./jun. 2007.

2Cf. CAMMAROSANO. Aumentos quantitativos e qualitativos do contrato e limites do artigo 65 da Lei nº
8.666/93. ILC Informativo de Licitações e Contratos, p. 520-523.

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Para tanto convém transcrevemos o artigo mencionado, com os dispositivos pertinentes:

Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:
I - unilateralmente pela Administração:
a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos;
b) quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei; (...)
§1º O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinqüenta por cento) para os seus acréscimos.
§2º Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder os limites estabelecidos no parágrafo anterior, salvo: (Redação dada pela Lei nº 9.648/98)

I - (Vetado) (Incluído pela Lei nº 9.648/98)

II - as supressões resultantes de acordo celebrado entre os contratantes. (Incluído pela Lei nº 9.648/98)
§3º Se no contrato não houverem sido contemplados preços unitários para obras ou serviços, esses serão fixados mediante acordo entre as partes, respeitados os limites estabelecidos no §1º deste artigo. (...)
§6º Em havendo alteração unilateral do contrato que aumente os encargos do contratado, a Administração deverá restabelecer, por aditamento, o equilíbrio econômico-financeiro inicial.

Esse artigo, no que dispõe a respeito de alterações unilaterais de contratos regidos pela lei sob comento, é um dos que consubstanciam prerrogativas especiais da Administração Pública, as denominadas cláusulas exorbitantes, desconhecidas no regime jurídico informador dos contratos firmados entre pessoas de direito privado, na gestão de interesses particulares dessas pessoas, físicas ou jurídicas, não voltados à satisfação do interesse público.

Com efeito, o art. 58, caput, da mesma lei, usa a palavra prerrogativa ao elencar algumas das notas características do regime jurídico dos contratados administrativos. Prerrogativas, dentre outras, de rescindi-los unilateralmente nos casos especificados no inciso I do art. 79; de aplicar sanções pela inexecução total ou parcial do ajuste; de ocupar provisoriamente bens, móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, em se tratando de serviços essenciais; de modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado.

A propósito, as prerrogativas da Administração Pública a que acabamos de nos referir justificam-se exatamente porque constituem instrumentos utilíssimos voltados à consecução das finalidades de interesse público que aquela deve atender.

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A expressa referência da lei a finalidades de interesse público, já no art. 58, I, da Lei nº
8.666/93, reportada à prerrogativa de modificar unilateralmente os contratos, assim como a expressão razões de interesse público, justificadoras de rescisão determinada também por ato unilateral da Administração, nos termos do art. 79, I, c.c. o art. 78, XII, evidencia a importância da noção interesse público. Conquanto soando vaga, imprecisa, essa é a expressão verbal de um conceito fundamental no direito público, pouco importando para esse reconhecimento a maior ou menor dificuldade que operadores do direito, administradores em geral e doutrinadores encontrem em face dela. Dificuldades que têm propiciado, não raro, indevidas e equivocadas considerações até mesmo quanto à compreensão e aplicação do princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado — supremacia sobre o mero interesse, não sobre o direito, evidentemente.

De qualquer forma, a prerrogativa de modificação unilateral de contratos pela Administração Pública, uma das expressões do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, apresenta-se, conformada pela lei.

É essa conformação que devemos identificar.

Pois bem. É certo que quando da realização de licitação, para subsequente assinatura de um contrato, deve haver acentuado esforço em estimar, com base em estudos e pesquisas, e nos termos de projetos e memoriais descritivos, quanto custará aos cofres públicos a execução do ajuste.

A Lei nº 8.666/93 revela, em variados dispositivos, a relevância que atribui à adequada identificação do objeto do contrato que se pretenda celebrar. Basta perpassar os olhos pelo art. 6º, incisos IX e X, que dispõem a respeito do projeto básico e executivo; art. 7º e seus parágrafos, que dispõem a respeito das etapas a serem observadas nas licitações para obras e serviços, que só podem ser levadas a efeito quando houver projeto básico e orçamento detalhado em planilhas; art. 14, que exige, para compras, adequada caracterização de seu objeto, e indicação dos recursos orçamentários; art. 40, I, §2º, I e II, que prescreve ser obrigatório que o edital indique o objeto da licitação, em descrição sucinta e clara, dele fazendo parte, como anexos, o projeto básico e/ou executivo, com todas as suas partes, desenhos, especificações e outros complementos, assim como orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários; art. 55, que dispõe ser cláusula necessária em todo contrato, dentre outras, a que estabeleça o objeto e seus elementos característicos.

Não obstante a obrigatoriedade de prévia e precisa definição do objeto de uma licitação e de um contrato, precedido este, ou não, de certame licitatório, a experiência tem

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demonstrado que nem sempre é possível ou conveniente a execução do contrato exatamente como planejado e firmado.

Com alguma frequência, para que um contrato seja levado a bom termo, respeitada a finalidade a que se destina, faz-se necessário, imprescindível mesmo, alterações de maior ou menor monta decorrentes de motivos ou ocorrências de variada natureza. Outras vezes, conquanto nada obste a execução do contrato rigorosamente consoante ajustado inicialmente, razões outras podem recomendar algumas alterações de sorte a melhor satisfazer o interesse público.

Alterações contratuais no campo do direito privado, informado ainda, em larga medida, pelo princípio da autonomia da vontade, podem ser levadas a efeito consoante a vontade livre das partes, consensualmente.

Já em se tratando de contratos regidos pelo Direito Público — no caso pela Lei nº
8.666/93 — só são admissíveis alterações nos termos, limites e condições estabelecidos pela própria lei, não vigorando o princípio da autonomia, mas a ideia de função, de dever jurídico, de indisponibilidade do interesse público, como insculpido no ordenamento jurídico.

Seja como for, o fato é que, no regime da Lei nº 8.666/93, os contratos, precedidos ou não de licitação — e a licitação é a regra — comportam alterações, sempre nos termos do seu art. 65.

Em se tratando de contratos decorrentes de licitação, as alterações contratuais reclamam acentuada cautela, em razão mesmo das finalidades dos certames licitatórios que não se pode burlar, quais sejam: garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração (art. 3º, caput). Destarte, não burlar a licitação, atentar sempre para as finalidades de interesse público, e observar as demais prescrições legais é o que se impõe ao administrador público. E por vezes realiza-se o interesse público exatamente procedendo-se a alterações contratuais.

Mas voltando um pouco mais para o objeto de um contrato, e da licitação que o tenha precedido, cumpre distinguir seus principais aspectos, quais sejam: natureza, vulto ou dimensão e especificações técnicas ou características.

Esses aspectos são de relevância para efeito de alterações contratuais.
À toda evidência não se pode admitir alterações do contrato que impliquem a substituição do objeto de determinada natureza por outro de natureza distinta.

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Também não se admite, ainda que mantida a...

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