Lixo automotivo é responsabilidade da cadeia produtiva

O Brasil é o quarto maior mercado do mundo em veículos automotivos e ainda não tem uma legislação ou um programa que indique o que será feito com o carro velho. A afirmação do presidente da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), Flávio Meneghetti, em entrevista à Folha de São Paulo [1], traz à tona a urgente necessidade de criação de uma regulamentação sobre o descarte ambientalmente adequado dos veículos automotivos, hoje inexistente.

O país conta com a recente Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), Lei 12.305/2010 [2], que estabeleceu a destinação final de resíduos sólidos. Ela traz como um de seus principais instrumentos a implementação da logística reversa, que é o retorno dos produtos à indústria depois do consumo, e a responsabiliza por danos ao meio ambiente causados pelo descarte incorreto do material. Além disso, exige coletas seletivas em todo o país, o fim dos lixões e a responsabilidade compartilhada entre quem fabrica, comercializa e consome o produto, conforme o artigo Lixo urbano é de responsabilidade da cadeia produtiva [3].

Entretanto, a nova Política não contempla a regulamentação para automóveis. Pela PNRS, cuja meta é alcançar o índice de reciclagem de 20% em 2015, até 2014 deverão estar cumprindo a logística reversa os fabricantes e comerciantes de agrotóxicos (seus resíduos e embalagens); pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes (seus derivados e embalagens); lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; além de produtos eletroeletrônicos e seus componentes.

Em seu artigo Aplicabilidade da logística reversa automotiva [4], Pedro Paulo Ayres Pinto considera que a indústria automotiva está enfrentando uma crescente pressão para aplicar “atividades verdes” dentro da gestão da cadeia produtiva. Ayres Pinto afirma que não restam dúvidas que o avanço tecnológico e a utilização de materiais diversificados trouxeram enormes avanços a este setor, entretanto, com as recentes preocupações ambientais, podemos afirmar que o sucesso da indústria automotiva em longo prazo dependerá da capacidade do setor para mixar o seu produto final e a cadeia produtiva, com a garantia de um futuro ecologicamente sustentável, afinal, não é crível desconstruir a tríade referencial de proteção ao meio ambiente, aplicação de recursos sociais e o fator econômico na busca de um desenvolvimento sustentável.

Importância econômica

Os dados econômicos sobre Logística Reversa, aqui apresentados, baseiam-se em estimativas projetadas por algumas pesquisas nos Estados Unidos, e em pesquisas em Logística Reversa de Pós Consumo em alguns setores no Brasil. Como os dados são setoriais e o interesse desta nova área é recente, acreditamos que as estimativas atuais sejam ainda conservadoras. No entanto, pode-se inferir o potencial de ganho e as oportunidades de desenvolvimento nesta nova área .

Nos Estados Unidos, pesquisas estimam em cerca de US$ 35 bilhões os custos de retorno de bens em 1997, ou seja cerca de 0,5 % do PNB do país, ou 4% dos custos logísticos totais ( US$ 862 bilhões em 1997). Somente o mercado de peças de automóveis remanufaturadas neste país foi de US$ 36 bilhões em 1997, de acordo com a Automobile Parts Rebuilders Association, através da atuação de 12 mil empresas de desmontagem de automóveis e de remanufatura de peças em atividade atualmente no país. [5]

A dimensão do problema

De acordo com a Fenabrave, a frota brasileira de carros tem idade média de 12 anos e a situação dos caminhões é ainda mais preocupante, com idade média de 23 anos. E este é um mercado que cresce a cada ano. Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), em 2012 foram comercializados 400 mil veículos no país. E a produção anual de veículos cresceu 110% entre 2003 e 2012, com o licenciamento de 20 milhões de novos carros (nacionais e importados) neste período, conforme dados divulgados em reportagem da Veja [6].

O grande problema está na forma como o veículo que já não está mais em condições de uso é descartado. Quando não são levados a desmanches, que muitas vezes atuam de forma inadequada, os carros são simplesmente abandonados nas ruas das cidades ou apreendidos por órgãos de trânsito e entulhados em depósitos a céu aberto. Expostos ao tempo, não têm o adequado recolhimento dos fluidos contaminantes, muitas vezes não podem ter seus materiais reaproveitados, além de se tornarem foco para a proliferação de mosquitos, inclusive o da dengue.

Cabe aqui um parêntese: sobre os desmanches, seguiu para apreciação do Senado o Projeto de Lei 23/2011[7], do deputado Armando Vergílio (PSD-GO), aprovado pela Câmara no início de junho de 2013, que disciplina o funcionamento de empresas de desmontagem de veículos.

Retomando, somente na cidade de São Paulo, são abandonados em média 1,5 mil carros por ano, segundo estimativas da prefeitura. Em reportagem, a revista Veja [8] revela que a fiscalização recolheu no ano passado uma média de 1,3 mil carcaças, um número recorde na história, segundo a prefeitura paulistana. A burocracia e a multa de R$ 12 mil desestimulam o proprietário a reaver seu bem, que acaba indo para leilão de sucatas. “Um quilo de ferragem é vendido, em média, por 30 centavos”, informa a reportagem.

Já em Pernambuco, o Departamento Estadual de Trânsito (Detran-PE) passou a reaproveitar para reciclagem os veículos considerados “sucata”, passando pelo processo de descontaminação e trituração. Em matéria no portal do órgão [9], a presidente do Detran-PE, Fátima Bezerra, estima que com o novo formato vai impedir o reaproveitamento de carcaças para a construção de carros “artesanais” usados de maneira indevida e retirará de circulação uma média de 500 carros das vias a cada ano.

O sucesso do Japão

Uma das experiências mais bem sucedidas em reciclagem automotiva no mundo é a do Japão, que conta com legislação específica e recicla anualmente 3,6 milhões de veículos, ônibus e caminhões. Durante o II Seminário Internacional sobre Reciclagem de Veículos e Renovação de Frota, promovido pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), em 2012, empresários japoneses apresentaram detalhes da prática no país.

O artigo [10] sobre o evento informa que, para um automóvel, a taxa média de recuperação é de 95% dos...

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