Depois da chuva, o arco-íris

Daniel Aarão ReismarceloAlourinha não teria nem seis anos, mas se aproximou da fotógrafa com desembaraço. Sorridente, bateu de leve os dedos da mão no lado direito da cabeça, como fazendo uma continência, e ergueu o pequeno cartaz: homo, hetero, tous égaux (homossexuais, heterossexuais, todos iguais).O bom humor da menina, em ponto minúsculo, sintetizava a imensa passeata que aconteceu em Paris no domingo, 27 de janeiro passado, reunindo cerca de 400 mil pessoas a favor da aprovação de uma lei que autoriza o casamento para pessoas de "sexo diferente ou do mesmo sexo".As multidões serpentearam lentamente da praça de Denfert-Rochereau, no Sul da cidade, de onde saíram no fim da manhã, sob uma chuvinha fina e fria, até a praça da Bastille, no Norte, onde chegaram já acompanhadas pelo sol - um solzinho inglês, fraco, mas reconfortante - e simbólico, pois, antes de a noite apressada chegar, despontou um arco-íris com as cores do movimento gay.Havia ali de um tudo, mas a nota dominante era a ironia. Beijavam-se, casando-se, a Cinderela e a Bela Adormecida. Abraçavam-se, amorosos, Batman e Robin. Num cartaz, uma garota pedia a namorada em casamento. Outro, lembrava que "mais vale um casamento gay do que um casamento triste". Uma grande faixa citava Jesus Cristo: "Amai-vos uns aos outros assim como eu vos amei." Por toda a parte, trocadilhos criativos, dificilmente traduzíveis. Alguém recordou a história: em fins do século XVIII certa Declaração Universal dos Direitos fora proclamada. Não seria o caso, em 2013, de aplicá-la?No topo de um caminhão, um grupo de gouines (termo pejorativo usado contra as lésbicas e reapropriado por elas em chave positiva) lembrava que a Virgem Maria fora a precursora da inseminação artificial. Assim, na Pont Marie, várias gouines , contorcendo-se teatralmente, pariram dezenas de balões vermelhos que subiram aos céus, que se abriram para acolhê-los em clareiras de azul pálido.Cartazes e faixas "sérios" elucidavam as questões em jogo: mesmos direitos para todos, sem discriminações. Por que negar direitos a quem tem os mesmos deveres? Por que manter na ilegalidade milhares e milhares de "uniões" afetivas existentes de fato?Os jovens constituíam grande maioria, com presença forte de adolescentes e crianças. Sem esquecer os heterossexuais, distribuindo bisous de solidarité (beijinhos de solidariedade) e até mesmo os tradicionais partidos e centrais...

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