A ecografia da decisão e o fim das surpresas no Direito

“De barriga de mulher grávida, de urna eleitoral e de cabeça de juiz, ninguém sabe o que pode sair”. Este é um antigo e conhecido ditado popular. Outro semelhante diz: “cada cabeça uma sentença”. Procurei sua origem sem qualquer sucesso. Descobri, entretanto, que este ditado não encontra correspondência em outros países, o que me leva a crer que se trata de um genuíno provérbio brasileiro, provavelmente em razão de nossa pré-modernidade. Ocorre que, com o passar do tempo e o surgimento de novas tecnologias, o referido ditado restou parcialmente derrogado. Isto porque, para barriga de mulher grávida, faz duas décadas que existe o exame de ecografia e, para urna eleitoral, temos as chamadas pesquisas de boca de urna, cada vez mais precisas, de maneira que, misteriosa mesmo, permanece sendo apenas a cabeça dos juízes.


Mas, afinal, importa saber como os juízes decidem os casos? Evidentemente que esta é uma pergunta retórica, como adverte Cárcova. Se a resposta fosse negativa, não haveria porque escrever esta coluna e tampouco existiriam tantos juristas preocupados com ela, especialmente nos Estados Unidos, onde se destacam as teorias de Ronald Dworkin, Richard Posner, Mark Tushnet, Laurence Tribe, Frank Michelman etc.


Agora, se a resposta é positiva — e sobre isto parece não haver dúvidas —, então fica claro que não basta acompanhar as sessões dos tribunais através da TV Justiça. É preciso aprofundar as investigações sobre aquilo que se denomina teoria da decisão judicial.


Antes disso, entretanto, caberia indagar — e esta, sim, é a pergunta importante, ao menos para colocar o problema — se a teoria da decisão é uma especificidade do direito norte-americano, uma vez que, de há muito, o ativismo judicial deixou de ser uma prática exclusiva dos países da common law.


De fato, a teoria da decisão é o modo como a teoria jurídica de matriz anglo-saxã enfrenta os problemas decorrentes da interpretação e da aplicação do Direito. Isto se justifica, de certo modo, porque nela os precedentes constituem a principal fonte de Direito; e também explica porque não existe, originalmente, uma cultura voltada ao estudo da teoria da decisão no interior da tradição romano-germânica.


Todavia, considerando que, nos últimos anos, observa-se uma nítida tendência de aproximação entre as tradições da common law e da civil law, tudo indica que é chegada a hora de se pensar na possibilidade de uma teoria da decisão adequada ao sistema da civil law — tal qual vem...

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