História e memórias ao entardecer

Fábio Vasconcellosfabiovas@oglobo.com.brMemórias. Afonso Arinos: entre as recordações, está a da vez em que se disfarçou de hippie para participar de uma manifestaçãoDaniela DacorsoA temperatura política estava nas alturas no início dos anos 1970 nos Estados Unidos. Uma sequência de notícias na imprensa apontava para o possível envolvimento do então presidente Richard Nixon no escândalo de Watergate. As suspeitas, que acabariam levando à renúncia dele, indicavam que o chefe do Executivo tinha conhecimento da invasão do escritório do Partido Democrata. Nas ruas, mais pressão. Americanos criticavam a permanência do país na Guerra do Vietnã. A situação nos EUA chamava a atenção em todo o mundo, e qualquer informação que ajudasse a compreender os próximos passos da crise valia ouro.Na embaixada brasileira em Washington, um ministro-conselheiro, com apenas 41 anos, tinha justamente a missão de garimpar informes e repassá-los ao Itamaraty com detalhes sobre a real situação no país. Para isso, criara uma rede de amigos e conhecidos na imprensa americana, que o abastecia diariamente com histórias sobre os bastidores da crise. Mas sua atenção estava também voltada para os acontecimentos fora dos círculos do poder. Um dia, ao tomar conhecimento de que centenas de hippies preparavam uma manifestação nas proximidades da Casa Branca, decidiu levar a cabo uma ação pouco comum na vida diplomática e que envolvia certo risco.Com óculos escuros, calça jeans e camisa com o símbolo de paz e amor, Afonso Arinos de Melo Franco e sua mulher, Beatriz Fontenelle, infiltraram-se entre os jovens para ver de perto o comportamento dos manifestantes. Em seguida, ele fez um relato preciso do clima político na capital americana. Para alívio da família, os dois "hippies" passaram despercebidos, sequer foram notados pelos agentes do serviço secreto americano que estavam no meio dos jovens para fotografá-los.- Era um risco. Imagina se descobrem que um funcionário da embaixada brasileira estava participando de uma manifestação que era contra o governo americano? Por isso, decidimos nos vestir de hippies. Sinceramente, não prestei atenção nos discursos. A minha intenção foi o tempo todo ver o comportamento das pessoas - recorda-se Afonso Arinos.A cena dos "hippies infiltrados" é lembrada com humor, não somente por causa dos trajes pouco comuns para um funcionário do Itamaraty acostumado a gravatas e ternos, mas devido a um episódio ocorrido na véspera. Para fazer o reconhecimento da área...

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