O aval na recuperação judicial e a expressão 'sócio solidário' contida no caput do art. 6o da Lei 11.101/2005

AutorJean Carlos Fernandes
Páginas338-349

Page 338

REspn. 1.095.352-SP (2008/0228114-0) Rel. Ministro Massami Uyeda Recte.: Wagner Canhedo Azevedo e Outro Advs.: Regina Aparecida Canhedo e Outros(s) Recdo.: Ansett Worldwide Aviation USA Advs.: Renata IezziFalsetti e Outros(s) j. 9.11.2010 DJ 29.11.2010

Ementa: Recurso Especial - Negativa de prestação jurisdicional - Não ocorrência -Questão da competência absoluta do juízo falimentar - Ausência de prequestionamento -Incidência da Súmula 211/STJ-Processamento do pedido de recuperaçãojudicial-Deferimento

- Suspensão da execução exclusivamente em face da empresa coexecutada - Possibilidade

- Obrigação cambiária - Autonomia -Prosseguimento - Execução - Avalistas -Recurso especial parcialmente conhecido e improvido. I - Não há omissão no aresto a quo, no qual se examinou os temas relevantes para deslinde da controvérsia, ainda que o resultado não tenha sido favorável à parte recorrente. II

- O tema atinente à competência absoluta do Juízo Falimentar não foi objeto de deliberação, sequer implícita, na Instância a quo, o que convoca o óbice da Súmula n. 211/STJ. III -

O deferimento do pedido de processamento de recuperação judicial à empresa coexecutada, à luz do art. 6o, da Lei de Falências, não autoriza a suspensão da execução em relação a seus avalistas, por força da autonomia da obrigação cambiária. IV - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi, a Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJRS) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Sidnei Beneti e Paulo Furtado (Desembargador convocado do TJBA).

Brasília, 9 de novembro de 2010 (data do julgamento).

Ministro Massami Uyeda, Relator.

Page 339

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Massami Uye-da (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto por Wagner Canhedo Azevedo e Outro fundamentado no art. 105, inciso III, alínea "a", do permissivo constitucional, em que se alega violação dos arts. 113, caput e § 2o, 535, inciso II, do Código de Processo Civil, além do art. 6o, § 1o, da Lei n. 11.101/2005.

Os elementos existentes nos autos noticiam que foi proposta execução de título extrajudicial pela ora recorrida, An-sett Worldwide Aviation USA, em face da VASP - Viação Aérea São Paulo S/A e de seus devedores solidários, ora recorrentes, em razão de notas promissórias não adim-plidas de que foram avalistas no valor de R$ 7.719.000,00 (sete milhões e setecentos e dezenove mil reais).

Em razão do deferimento do pedido de processamento de recuperação judicial da VASP - Viação Aérea São Paulo S/A, pelo r. Juízo da 1a Vara Especial de Recuperação de Empresas do Foro Central da Capital/SP (fls. 41/44), os ora recorrentes, Wagner Canhedo Azevedo e Outro atravessaram petição (fls. 39/40) pleiteando a suspensão da execução, ao fundamento da competência universal do Juízo Falimen-tar e da extensão da suspensão da execução em face dos devedores solidários.

Em primeiro grau, o r. Juízo da 5a Vara Cível da Comarca da Capital/SP deferiu a suspensão do feito exclusivamente em relação à VASP - Viação Aérea São Paulo S/A, determinando, por conseguinte, o prosseguimento da execução em face dos ora recorrentes, Wagner Canhedo Azevedo e Outro (fl. 46).

Inconformados, Wagner Canhedo Azevedo e Outro, apresentaram agravo de instrumento, tendo o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negado--lhes provimento, cuja ementa está assim redigida: "Recuperação Judicial - Lei n. 11.101/2005 - Efeitos não estendidos a garantidores de obrigação solidária - Art. 49, § 1o de referida Lei - Agravo de instrumento não provido".

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 108).

Sustentam os recorrentes, Wagner Canhedo Azevedo e Outro, em resumo, negativa de prestação jurisdicional porque o v. acórdão recorrido deixou de se pronunciar, quando deveria fazê-lo, acerca dos limites da competência das varas cíveis em relação ao Juízo universal da recuperação judicial. Asseveram, também, que, deferido o processamento da recuperação judicial da coexecutada, VASP -Viação Aérea São Paulo S/A, a execução deve ser suspensa também com relação aos devedores solidários.

Alegam, finalmente, que o prosseguimento da execução, em face dos recorrentes, viola a competência universal do Juízo Falimentar.

Apresentadas contrarrazões (fls. 137/147), a ora recorrida aponta inexistência de violação ao art. 535, inciso II, do Código de Processo Civil, bem como afirma que os devedores, na qualidade de avalistas da VASP - Viação Aérea São Paulo S/A, não estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, tampouco, de eventual suspensão da execução de título extrajudicial.

Sobreveio, então, juízo negativo de admissibilidade do recurso especial (fls. 153/154). Interposto agravo de instrumento, sob o n. 1.048.557-SP, determinou-se a subida dos autos principais, para melhor exame da matéria controvertida.

O ilustre Representante do Ministério Público Federal ofertou parecer pelo improvimento do recurso especial.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Massami Uyeda:

Page 340

A irresignação não merece prospe-rar.

Com efeito.

Inicialmente, no que atine ao art. 535, inciso II, do Código de Processo Civil, observa-se, da análise dos autos, que não há se alegar, como se quer neste inconformis-mo, negativa de prestação jurisdicional.

In casu, o Tribunal de origem examinou os temas relevantes para conclusão da controvérsia, notadamente acerca da possibilidade de suspensão da execução em face dos avalistas, embora o resultado não tenha sido favorável à parte recorrente. É entendimento assente que o órgão judicial, para expressar sua convicção, não precisa mencionar todos os argumentos levantados pelas partes, mas, tão somente, explicitar os motivos que entendeu serem suficientes à composição do litígio.

Registra-se, ainda, que a prestação jurisdicional que se revela contrária ao interesse de quem a postula, não se identifica, não se equipara, nem se confunde, para efeito de acesso à via recursal extraordinária, com a ausência de prestação jurisdicional.

Além disso, relativamente à dita violação do art. 113 e § 2° do Código de Processo Civil, verifica-se que o tema relativo à competência absoluta do Juízo Falimen-tar não foi objeto de debate pelo v. aresto impugnado. Dessa forma, ausente o indispensável prequestionamento viabilizador do apelo nobre, é de se impor a incidência do disposto na Súmula 211/STJ.

Antes de se examinar o mérito, é de rigor uma breve digressão fática.

A ora recorrida, Ansett Worldwi-de Aviation USA, ajuizou uma execução por título extrajudicial em face da VASP - Viação Aérea São Paulo S/A e seus avalistas, ora recorrentes.

Noticiado o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial da executada pessoa jurídica, foi determinada a suspensão da execução com relação a ela, autorizando-se o regu-lar prosseguimento contra os executados avalistas.

A controvérsia, portanto, aqui agitada diz respeito à extensão, ou não, da suspensão do curso da execução, em razão do deferimento do processamento da recuperação judicial, aos sócios avalistas, devedores solidários da pessoa jurídica, entre eles os ora recorrentes Wagner Canhedo Azevedo e Outro.

De acordo com o art. 6o da Lei n. 11.101/2005, a decretação de falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário. Observa-se que a finalidade do dispositivo apontado é impor, aos credores do falido, a "vis attrac-tiva" do processo falimentar e a formação da massa subjetiva, que passa a atuar como uma unidade, garantindo, assim, o tratamento igualitário a todos os credores.

A mens legis do mencionado art. 6° da Lei de Falência quis dizer, em sua parte final, que, existindo ações e execuções movidas, seja contra a falida ou a recupe-randa, por credores particulares de seus sócios solidários, tais demandas devem ser suspensas. De modo que não significa que eventuais coobrigados solidários em um título cambial possam beneficiar-se com a suspensão da execução contra eles promovida.

Na verdade, em razão da autonomia das obrigações assumidas no título de crédito exequendo, não é possível prosperar, data vênia, a tese de que o disposto no art. 6° da nova Lei de Falências abarca as execuções movidas em prejuízo dos devedores solidários. De fato, quem está em recuperação judicial é a VASP - Viação Aérea São Paulo S/A, devedora principal, não seus sócios ou coobrigados. De forma que a situação ou status da empresa aérea não configura impedimento, em princípio, ao prosseguimento da execução movida em desfavor daqueles.

Page 341

Ademais, na realidade, é de se registrar, também, a redação contida no art. 49, § F, da Lei n. 11.101/2005, in verbis: "(...). § F. Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigado de regresso". Assim, observa-se, pela redação do referido dispositivo, que os credores sujeitos aos efeitos da recuperação judicial conservam intactos seus direitos e, por lógica, podem executar o avalista desse título de crédito, no caso, as notas promissórias. Esta diretriz jurisprudencial está bem delineada na seguinte...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT