A Incompatibilidade da Substituição Tributária do ICMS com a Opção pelo Simples Nacional

AutorFábio Pugliesi
CargoDoutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo. Especialista em Administração pela EAESP-FGV. Professor adjunto da Escola Superior de Administração e Gerência da Universidade do Estado de Santa Catarina, Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí e ...
Páginas285-306

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Doi: http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2012v33n64p285

A Incompatibilidade da Substituição Tributária do ICMS com a Opção pelo Simples Nacional

Fábio Pugliesi1Resumo: Este artigo estuda a compatibilidade das disposições da Constituição da República Federativa do Brasil, relativas à substituição tributária progressiva e ao regime jurídico de recolhimento simplificado e único em que se inclui o imposto sobre operações relacionadas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação (ICMS). Analisa-se a disciplina da apuração pelo regime simplificado instituído pela Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de 2006, denominado Simples Nacional, os meios de controle da arrecadação e da fiscalização do Simples Nacional. Expõe o histórico, competência tributária, hipótese de incidência e o princípio da não cumulatividade do ICMS. Expõe as formas de substituição tributárias admitidas, em particular a substituição tributária progressiva, e o acórdão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.851-4. Por fim, considera que é incompatível o exercício da substituição tributária com o Simples Nacional.

Palavras-chave: Substituição Tributária. Simples Nacional. ICMS.

Abstract: This article examines the compatibility of the provisions of the Constitution of the Federative Republic of Brazil concerning the replacement tax and progressive legal framework for simplified and unique collection which includes the tax on circulation of merchandises and services on the interstate transportation and communication - ICMS. Analyze the subject of scrutiny by the simplified scheme introduced by Complementary Law 123 of 14 December 2006, called Simple National, means of control, collection and monitoring of National Simple. Exposes the historical of power to tax and the principle of non-cumulative ICMS. Exposes the replacement tax forms allowed, in particular the progressive tax replacement, and the Supreme Court ruling in the Federal Direct Action of Unconstitutionality n. 1851-4. Finally, it considers that the exercise is of replacing incompatible with the Single National tax.

Key words: Tax Substitution. National Simple. ICMS.

1Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo. Especialista em Administração pela EAESP-FGV. Professor adjunto da Escola Superior de Administração e Gerência da Universidade do Estado de Santa Catarina, Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí e Faculdade Estácio de Sá Santa Catarina. E-mail: fabio_pugliesi@hotmail.com.

Recebido em: 26/02/2012.

Revisado em: 30/04/2012.

Aprovado em: 16/05/2012.

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1 Introdução

O Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições, devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
– Simples Nacional e instituído pela Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de 2006, veicula uma disciplina de apuração de tributos que busca conferir tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas (ME) e para as empresas de pequeno porte (EPP) e é determinado pela Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB).

A Emenda Constitucional (EC) n. 3, de 17 de março de 1993, introduziu, na CRFB, a possibilidade da lei atribuir ao sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, denominado de substituição tributária progressiva ou “para frente”.

Outros tributos podem ser objeto de substituição tributária progressiva, mas se analisará a compatibilidade do regime jurídico da subs-tituição tributária do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação (ICMS), de competência dos Estados, nas aquisições de mercadorias destinadas à industrialização e revenda por empresas optantes pelo Simples Nacional.

A aplicação da substituição tributária, nos fornecimentos para ME e EPP, para as optantes do Simples Nacional tem grande relevância, pois tem se verificado que os Estados têm fixado critérios que resultam em preços presumidos de venda superiores aos verificados no mercado, o que tem dificultado e até inviabilizado a atividade das MEs e das EPPs.

O conteúdo deste artigo encontra-se organizado da seguinte forma para analisar a compatibilidade da substituição tributária do ICMS com o Simples Nacional: primeiramente, descrevem-se a forma de apuração, os meios de controle da arrecadação e fiscalização do Simples Nacional. Em seguida, considera-se a disciplina do ICMS, seu histórico e, em especial, o princípio da não cumulatividade. Posteriormente, analisa-se o instituto da substituição tributária, em especial a substituição tributária progressiva, prevista no parágrafo 7, do artigo 150 da CRFB, acrescentada pela EC

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n. 3/93, em vista do acórdão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1851-4, bem como a compatibilidade desse acórdão com o regime de apuração do Simples Nacional, agravado por ser anterior à EC n. 42/03.

Por fim, estuda-se a disciplina da relação da “opção” pelo regime de apuração simplificado, previsto no inciso III, alínea “d” do artigo 146 da CRFB, acrescentado pela EC n. 42/03, e o regime da substituição tributária progressiva.

2 Simples Nacional

A CRFB, no inciso IX do artigo 170, elenca, entre os princípios que devem orientar a ordem econômica, o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Segundo Eros Roberto Grau, trata-se de um princípio constitucional impositivo2, segundo a classificação de José Joaquim Gomes Canotilho, autorizando a reivindicação, por tais empresas, pela realização de políticas públicas. (GRAU, 2007, p. 253)

No artigo 179 da CRFB, tal princípio impositivo segue reafirmado ao se obrigar que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando incentivá-las pela simplificação no cumprimento de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias “[...] ou pela eliminação ou redução destas por meio da lei”.

Infere-se que a expressão “[...] eliminação ou redução destas por meio da lei [...]” tem o caráter de impor que a lei venha ampliar, ainda mais, a simplificação da observância da lei, jamais dificultar.

Para garantir ainda mais essa imposição constitucional, a par das limitações constitucionais ao poder de tributar que será objeto de análise na

2Os princípios constitucionais impositivos subsumem-se todos os princípios que, no âmbito da constituição dirigente, impõem aos órgãos do Estado, sobretudo ao legislador, c"tgcnk¦c›«q"fg"Ýpu"g"c"gzgew›«q"fg"vctghcu0"*ECPQVKNJQ."3;;3."r0"39;+

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medida de sua relação com tema, a CRFB veio autorizar, por intermédio da Emenda à Constituição n. 42, de 19 de dezembro de 2003, a instituição de um regime único de arrecadação dos impostos e das contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme o disposto no parágrafo único do artigo 146, segundo o disposto na Emenda à Constituição n. 42, de 19 de dezembro de 2003.

A Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de 2006, com as modificações introduzidas pela Lei Complementar n. 127, de 14 de agosto de 2007 e a Lei Complementar n. 139, de 10 de novembro de 2011, doravante denominada “Simples Nacional”, a par de instituir o regime de arrecadação já aludido, define como microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário, registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, buscando simplificar as formalidades de constituição, funcionamento e extinção da atividade empresarial com o objetivo de reduzir os controles e as formalidades que dificultam a atividade empresarial do Brasil.

A fim de enquadrar-se como tal, o empresário, a pessoa jurídica ou a pessoa a ela equiparada para fins de tributação, em particular do imposto de renda, deve auferir, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 (trezentos de sessenta mil reais), a fim de ser considerada microempresa para os fins dessa lei; e até R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais) para ser considerada empresa de pequeno porte.

A lei prevê exceções decorrentes dos sócios e da atividade, cuja análise se abstrai por extrapolar os limites do presente artigo. Pode-se reafirmar, porém, que as MEs e as EPPs devem ter a forma de empresas individuais, sociedades limitadas ou empresa individual de responsabilidade limitada, nas duas últimas formadas exclusivamente por pessoas naturais.

Institui, também, a Lei Complementar n. 123/06, o Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte a que denomina Simples Nacional, segundo o autorizado pela Constituição Federal.

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Em virtude do enquadramento no Simples Nacional, o contribuinte pode recolher, por meio de documento único (curioso que a lei destaca isso explicitamente3) os seguintes tributos: Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ); Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), não incluso para tal fim o incidente na importação; a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); a...

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