Direitos humanos e nanotecnologias: o fascínio da critividade em busca de espaços cada vez menores

AutorAndré Stringhi Flores; Wilson Engelmann
Páginas157-169

Page 157

1 A (Re) invenção do futuro: em busca de espaços cada vez menores

Há aproximadamente12 50 anos, Richard Feynman ao falar que:os princípios da física não falam contra a possibilidade de manipular as coisas átomo por átomo. Não seria uma violação da lei; é algo que, teoricamente, pode ser feito mas que, na prática, nunca foi levado a cabo porque somos grandes de mais”3”, previu o futuro; o futuro da revolução industrial das nanotecnologias. Em uma palestra, com o título de “existe muito mais espaço lá em baixo”, no Instituto de Tecnologia da Califórnia, Feynman relatou que as tecnologias poderiam tornar produtos muito pequenos, de tal modo que poderiam igualar ao tamanho dePage 158 átomos, pois os átomos poderiam ser organizados conforme a necessidade, desde que não houvesse violações às leis da natureza. “O objetivo da nanotecnologia, de acordo com a proposta do autor, era criar materiais e desenvolver produtos e processos baseados na capacidade de tecnologia moderna de ver e manipular átomos e moléculas”4. Desde então, houve o processo de desenvolvimento de tal tecnologia, que chega ao século XXI como a área das grandes possibilidades; um “fascínio da criatividade”5.

Define-se como nanotecnologias, as tecnologias em que a matéria é manipulada às escalas atômicas e moleculares para criar novas matérias e processos com características funcionais diferentes das matérias comuns, relacionado a tamanho dentro de uma escala entre 0,1 a 100 nm. Nano significa, ipsis litteris: “do grego nánnos - ‘de excessiva pequenez’ ou nânos ‘anão”6. Refere, pois, a uma escala de medida menor que a micro, ou seja, está numa ordem onde os átomos se encontram - dez na menos nove”7. Portanto, deduz-se, logicamente, que a concepção da nanoescala é 1.000 vezes menor que a microescala. Já o vocábulo tecnologia, verbis: “teoria geral e/ou estudo sistemático sobre técnicas, processos, métodos, meios e instrumentos de um ou mais ofícios ou domínios da atividade humana”3.

Paulo Martins define nanotecnologia como “um conjunto de ações de pesquisa, desenvolvimento e inovação que são obtidas graças às especiais propriedades da matéria organizada a partir de estruturas de dimensões nanométricas [...]”8. A tecnologia “nano” é verdadeiramente uma ciência multidisciplinar, relacionada à manipulação de átomos e moléculas objetivando formar novos produtos, criar dispositivos que permitam trazer, aos produtos já existentes, novas funções, ou até mesmo criar seres vivos novos9, que possui vasto campo de desenvolvimento na era global e traz perspectivas extremamente grandes concernentes a avanços medicinais, eletrônicos e biotécnicos.

A “new tecnology” engloba as tecnologias da informação (bits), a nanotecnologia (átomos), a neurociência e a biotecnologia, portanto, a nanotecnologia encontra-se em processo de convergência. O gráfico abaixo mostra o desenvolvimento econômico da tecnologia nos maiores pólos mundiais – dados que demonstram a efetiva valorização desta nova tecnologia no início do século XXI.

Page 159

[GRÁFICOS NÃO ESTÃO INCLUÍDAS]

Conforme estimativa realizada pela revista National Science Foundation10, num lapso temporal compreendido entre 10 (dez) e 20 (vinte) anos, significativa parte da produção industrial relativa à saúde e meio ambiente será alterada por esta nova tecnologia, o que gerará incomensurável crescimento econômico, a partir da criação de inúmeras oportunidades pessoais, calcadas no desenvolvimento sustentável e na preservação ambiental. Isso porque ao realizarem-se manipulações atômicas e moléculas individuais, a nanotecnologia permitirá maior controle sobre a tecnologia atual, admitindo, inclusive, controlar a poluição, a destruição ambiental e a reciclagem de tudo que se possa imaginar.

A multiplicidade de aplicações - juntamente com a facilidade, qualidade e velocidade da produção – é o centro da equação deste novo produto da ação humana. A nanotecnologia já encontra aplicações em praticamente todos os setores da indústria; a utilização em grande escala está relacionada aos nanocompósitos poliméricos, produzido a partir de commodities como os termoplátiscos e argilas. Além disso, é utilizado em quantidades reduzidas, com maior valor agregado, fomentando os setores da tecnologia da informação e de telecomunicações11.

No campo da medicina é encontrado o terreno mais fértil para o avanço das pesquisas em nanotecnologia e o desenvolvimento da nanociência. A produção da medicação (tecnologia molecular que pode ser produzida a partir de matérias-primas decorrentes da natureza, ou ser criada em laboratório) é uma das áreas com maiores indícios de desenvolvimento, porquanto os medicamentos trabalham em nanoescala (escala, na qual as próprias enfermidades tendem a agir), por esse motivo, são os meios mais empregados no combate a doenças. Os vírus12, por exemplo, são nanomáquinas naturais que se ligam às células e as forçam a sintetizar proteínas capazes de dotar de energia outro pequeno vírus, ocasionando oPage 160 desaparecimento dessa célula e desenvolvendo milhares de novos vírus para perpetuar o processo. Nesse diapasão, a nanotecnologia poderá ser usada para combater tais agentes infecciosos e todas outras doenças de forma mais veloz e eficiente do que o próprio organismo natural. Ao mesmo tempo, a tecnologia “nano” poderá desenvolver medicamentos com princípios ativos permanentes por um período de tempo mais longo e com melhor controle sobre o corpo humano, não ocasionando efeitos colaterais, conseguindo, deste modo, os resultados desejados.

Em um futuro não muito distante, a nanotecnologia poderá ser o instrumento ideal para a criação de uma medicação que será o modelo perfeito do próprio processo da doença. Segundo Lampton13“uma nanomáquina de combater às doenças, com objetivos múltiplos, poderia assumir a forma de uma miniatura de um submarino que navegaria pela corrente sanguínea”. Nesse submarino estaria um poderoso computador. Esses “computadores” poderiam ser destinados a cuidados com a saúde, como por exemplo: desbloqueamento de artérias, dissolução de tumores cancerígenos, etc. Nesse sentido, atuais pesquisas desenvolvem a construção de: nano-reatores que reforçam o metabolismo, fazendo com que as células lutem contra o câncer14; nanopropulsores, que acionados por luzes, operam no interior de células vivas, conseguindo localizar células cancerosas, carregando e liberando medicamentos em pontos específicos do organismo (sendo possível, inclusive, a utilização por controle remoto); Biochips que detectam células cancerosas entre um bilhão de células sadias, identificam grupos sanguíneos por meio de sequenciamento genético, diminuindo o risco de reações adversas em transfusões de sangue – atingindo uma precisão de 99,8% de acerto, e capazes de fazer diagnósticos automáticos de doenças, e permitem estudo detalhado de neurônios; máquinas de costura microscópica capazes de costurar longas cadeias de DNA sem quebrá-las que poderão ser utilizadas em sequenciamento genético, bem como na eletrônica molecular; mecanismos que permitem a criação de açúcares de forma automatizada, construindo organelas artificiais que finalizam o processo de síntese de proteínas, recobrindo-as com açúcares em arranjos altamente especializados, que se assemelham ao complexo golgiense15; entre outros.

Page 161

Todavia, para o desenvolvimento de tal tecnologia será necessário o aprimoramento das pesquisas, sendo imperioso, a redução de escalas de dispositivos microeletrônicos; a criação e aplicação de técnica nanolitográficas (Arte ou processo de produzir um desenho em escala nano); o desenvolvimento de microssistemas e dispositivos optoeletrônicos e fotônicos16. Neste âmbito, pesquisas17 já concretizam a criação de dosímetro descartável que mede nível de exposição aos raios ultravioleta; micro-microscópio, quatro vezes mais preciso que o microscópio eletrônico; peças metálicas usando moldes de polímero – com detalhes estruturais cerca de 100 vezes menores do que uma bactéria18; nanoturbina de elétrons que possibilitará a movimentação de nanorrobôs, bem como o chaveamento ultra-rápido em sistemas de telecomunicações19; nanomolas capazes de absorver choques com grande eficiência (além de proteger equipamentos miniaturizados, os pesquisadores acreditam que suas nanomolas logo poderão se tornar parte integrantes de pára-choques de automóveis, mancais, solados de sapatos esportivos e qualquer outro equipamento que requeira proteção antichoque20); materiais artificiais com capacidade de curvar as ondas eletromagnéticas; nanocircuitos; supercomputadores, que são capazes de tornar objetos invisíveis ao olho humano21; além de aplicações no segmento de cosméticos e eletrodomésticos.

Para tal acontecimento, pesquisas e experiências, necessariamente, acontecerão. Eis, aqui, o maior perigo do emprego de nanotecnologias, pois, pouco se sabe sobre os riscos sobre emprego em escala nano.

Exposto em linhas gerais o desenvolvimento das nanotecnologias nos últimos anos. Cabe, agora, enfatizar que no Brasil, foi patenteado recentemente o spray drying envolvendo a adição de partículas de SIO2 antes da secagem, na preparação de nanocápsulas ou nanoesferas para encapsulação de diclofenaco, o conhecido antiinflamatório. Com isso, consegue-se “maior estabilidade de dispersão, melhor distribuição do tamanho das partículas e uma viabilidade industrial para a produção das nanopartículas, evitando o processo de liofilização22.

Page 162

Além disso, outras áreas de desenvolvimento dessa nova tecnologia podem ser enumeradas. Entre elas, destacam-se: a) à nanoeletrônica (desenvolvimento de microeletrônica de ultra-alta compactação e miniturização, especialmente para as tecnologias de informação e computação, mas em escalas significativamente menores...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT