OAB foca em bandeiras da advocacia e consegue vitórias

Logo após vencer uma antropofágica eleição para o comando do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o piauiense Marcus Vinícius Furtado Coêlho viu, no início do ano, as seccionais divididas. Quinze anos de paz regada a acordos de rodízio na Presidência acabaram em clima de inimizade. Hoje, passados nove meses, a entidade não mostra sequelas. Pelo contrário, adquiriu musculatura ao diminuir o tom dos discursos por punições a bandidos na sociedade e focar batalhas onde podia ser protagonista. O que tem dado bons resultados.


A primeira vitória foi a derrubada da Emenda Constitucional 62/2009, fruto da chamada PEC do Calote, que permitia ao poder público parcelar o pagamento de seus precatórios e fazer leilões para quem quisesse receber primeiro — e menos do que tinha direito. Em março, o Supremo Tribunal Federal declarou a norma inconstitucional.


A mais recente veio na última semana, quando a Câmara dos Deputados rejeitou, por maioria esmagadora, projeto de lei que pretendia acabar com o Exame de Ordem.


Nesse ínterim, o Conselho Federal assumiu brigas paulistas no Conselho Nacional de Justiça. A seccional bandeirante foi uma das que se opuseram à candidatura de Marcus Vinícius, mas teve o apoio dele contra norma do Tribunal de Justiça do estado que reduziu o horário de atendimento nos fóruns. A regra acabou suspensa por uma liminar confirmada pelo Plenário do Conselho. Reclamação contra outro tribunal com sede em São Paulo, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, também foi encampada pela OAB no CNJ, que defendeu — e ganhou — o direito de a advocacia ter assento na comissão de concurso para juízes federais da corte.


Escolher as brigas — e os adversários — garantiu poder de fogo. O novo Código de Processo Civil, um dos projetos de lei mais polêmicos sobre temas jurídicos em tramitação no Congresso, tem a assinatura da Ordem em temas caros como a igualdade de honorários a serem pagos tanto pelo particular quanto pelo poder público em causas opondo Fazenda e cidadão, e as tão aspiradas férias dos advogados, com a suspensão dos prazos processuais entre 20 de dezembro e 20 de janeiro. O texto já passou pelo Senado e aguarda votação na Câmara.


As conquistas encorajaram a entidade a ser intérprete das manifestações de junho e encampar bandeiras pouco ligadas à classe, como a reforma política e o Saúde +10, projeto em que a autarquia propõe que o governo federal seja obrigado a gastar 10% do orçamento com o sistema público de saúde. Segundo Marcus Vinícius, o texto é de iniciativa popular e já conta com 2 milhões de assinaturas.


O avanço deu ainda coragem ao Conselho Federal para mexer em um vespeiro: decidir se a quarentena a que se submetem juízes aposentados para advogar vale também para os escritórios dos quais são sócios. Por unanimidade, os conselheiros entenderam que sim. A decisão respondeu a uma consulta formulada há mais de três anos e causou polêmica. Na Justiça, a norma tem sido contestada, tendo sido derrubada liminarmente e, posteriormente, declarada válida pelo ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal.


Estão na mira, agora, batalhas pela criação das sociedades individuais de advogados e da inclusão da classe no regime tributário do Simples, a criminalização da violação de prerrogativas e o pagamento de honorários sucumbenciais nas causas trabalhistas.


No próximo dia 23 de outubro, a Ordem faz a última audiência pública para entregar ao Ministério da Educação sua proposta para reformar o curso de Direito no país, após fazer audiências em todas as seccionais desde março. No próximo ano, devem sair também novas regras para os Tribunais de Ética da OAB — o que passa pela revisão das atuais restrições em vigor, como a que proíbe o marketing pelos profissionais.


Marcus Vinícius visitou a redação da ConJur no último dia 12 de outubro, acompanhado do presidente da Comissão Especial de Defesa dos Credores Públicos, Marco Antonio Innocenti, quando concedeu a entrevista.


Leia trechos da conversa:


ConJur — A última campanha pela Presidência da OAB foi muito disputada e criou dissensões principalmente em relação às seccionais de São Paulo e Paraná. Como está o quadro agora?

Marcus Vinícius — Está tudo pacificado. Fui homenageado pela Academia Paulista de Letras Jurídicas e o presidente Marcos da Costa, da OAB-SP, esteve sentado comigo na mesma mesa durante o jantar. O Paraná está totalmente integrado também. Vou, inclusive, fazer um evento em Foz do Iguaçu a convite da seccional. A Ordem hoje não tem mais aquele clima de oposição. Isso ficou na eleição. Eu chamei os que perderam e abri as portas. Basta ver os atuais integrantes das comissões. Além disso, várias vitórias de São Paulo tiveram a participação do Conselho Federal. Um exemplo foi a questão da redução do horário de expediente para atendimento a advogados no Tribunal de Justiça. Entramos no CNJ a favor da OAB de São Paulo. Outro exemplo foi o da manutenção do nome do indicado da OAB para compor a comissão de concurso do TRF-3, que conseguimos também no CNJ. Temos trabalhado em parceria. Em relação à OAB do Paraná, estamos na briga pela implantação dos novos tribunais regionais federais.


ConJur — Quais são hoje as principais bandeiras da OAB?

Marcus Vinícius — A Ordem é dos advogados, mas também do Brasil. Por isso, temos pautas corporativas e de defesa da sociedade. A pauta corporativa inclui a defesa da profissão, na qual podemos colocar o Simples dos advogados, a sociedade individual de advocacia, os honorários da advocacia trabalhista e a criminalização da violação das prerrogativas. Tem as pautas mistas, que ficam entre a valorização da profissão e a defesa da sociedade, na qual eu colocaria a questão do ensino jurídico, para a qual estamos estudando um novo marco regulatório, a do Exame de Ordem e a dos precatórios. Há também causas da República e da sociedade, que são também missões da Ordem, como a reforma política, a lei de defesa dos usuários de serviços públicos e o programa Saúde +10, que é um projeto de lei que propusemos.


ConJur — Em que pé está cada uma dessas batalhas?

Marcus Vinícius — Quanto à sociedade individual do advogado, estamos dialogando com o autor e o relator do projeto de lei da Câmara para dar celeridade ao assunto. Já existe a figura da sociedade individual no mercado, mas o Estatuto da Advocacia não permite para advogados. Como o Estatuto da OAB é uma lei específica, tem que ser alterado para se adequar a essa nova realidade.


ConJur — E por que que isso é bom?

Marcus Vinícius — Porque hoje temos 800 mil advogados e só 24 mil pessoas jurídicas. Há cerca de 500 mil advogados não formalizados.


ConJur — Mas eles não prestam serviços como autônomos?

Marcus Vinícius — Sim, e recebem pela pessoa física. Com a sociedade individual, poderão receber pela pessoa jurídica e ter um alívio tributário.


ConJur — E quanto aos demais projetos?

Marcus Vinícius — Também lutamos pela inclusão do advogado no Simples, do que já conseguimos aprovação neste ano no Senado. O assunto está na Câmara dos Deputados, com pedido de regime de urgência subscrito por todos os líderes partidários. E também estamos lutando pelos honorários da advocacia trabalhista. Conseguimos aprovação este ano na Câmara e o texto agora está no Senado. Já conseguimos aprovação na Comissão de Assuntos Sociais e o projeto foi para a Comissão de Assuntos Econômicos. Ter honorários na Justiça do Trabalho vai ser bom para todos. É o único ramo da Justiça onde as causas têm conteúdo econômico, mas não há honorários de sucumbência. É inadmissível essa discriminação. Com honorários, as reclamações serão mais realistas, haverá menos pedidos descabidos. Por outro lado, não se dará ao reclamante o custo completo do processo, que ele tem hoje. Além de ter que ir atrás dos seus direitos, ele tem que pagar sozinho os honorários, ou seja, assume o custo do processo, o que é uma injustiça.


ConJur — O que é o Saúde +10?

Marcus Vinícius — Dentre as causas da República, entendemos que a sociedade necessita do cumprimento do direito constitucional à...

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