Palacianos e aulicismo no Segundo Reinado ? a facção áulica de Aureliano Coutinho e os bastidores da corte de D. Pedro II

AutorJulio Bentivoglio
CargoProfessor do Departamento de História Programa de Pós-Graduação em História Social das Relações Políticas da Universidade Federal do Espírito Santo
Páginas187-221
1 Professor do Departamento de História Programa de Pós-Graduação em História Social das Relações
Políticas da Universidade Federal do Espírito Santo. Email: juliobentivoglio@gmail.com. Esta pesquisa
contou com apoio financeiro do CNPq.
PALACIANOS E AULICISMO NO SEGUNDO REINADO –PALACIANOS E AULICISMO NO SEGUNDO REINADO –
PALACIANOS E AULICISMO NO SEGUNDO REINADO –PALACIANOS E AULICISMO NO SEGUNDO REINADO –
PALACIANOS E AULICISMO NO SEGUNDO REINADO –
A FA F
A FA F
A FACÇÃO ÁULICA DE AURELIANO COUTINHO E OSACÇÃO ÁULICA DE AURELIANO COUTINHO E OS
ACÇÃO ÁULICA DE AURELIANO COUTINHO E OSACÇÃO ÁULICA DE AURELIANO COUTINHO E OS
ACÇÃO ÁULICA DE AURELIANO COUTINHO E OS
BABA
BABA
BASTIDORES DASTIDORES DA
STIDORES DASTIDORES DA
STIDORES DA CORTE DE D. PEDRO II. CORTE DE D. PEDRO II.
CORTE DE D. PEDRO II. CORTE DE D. PEDRO II.
CORTE DE D. PEDRO II.
Julio Bentivoglio1
Resumo: Discute-se aqui o significado do aulicismo e a presença da nobreza
palaciana na vida política imperial brasileira entre 1831 e 1848. Destaque para a
chamada facção áulica de Aureliano Coutinho. São apontadas algumas caracte-
rísticas do grupo, sua inserção nos gabinetes e sua presença marcante governo e
na política imperial oitocentista.
Palavras-chave: História Política; Brasil Império; Palacianos; Facção Áulica;
Corte.
Aulicism and palatians in Second Empire – Aureliano Coutinho´s facção
áulica and the scenes of the court of D. Pedro II.
Abstract: This article discusses the significance of aulicism and the presence of
the nobility palace in the imperial Brazil politics life between 1831 and 1848.
Highlight of the Aureliano Coutinho´s facção áulica. Some caracteristics of the
group are indicated, its inclusion in offices and its strong presence in government
and imperial policy nineteenth.
Keywords: Political History; Brazil Empire; Palacians; Facção Áulica; Court.
INTRODUÇÃO
Referindo-se ao aulicismo na corte de D. Pedro II, Sérgio Buarque de
Holanda vaticinou que a política no início do Segundo Reinado foi marcada por
uma intensa disputa entre palacianos e partidaristas, na qual o espírito partidário
derrotou aos poucos o aulicismo2. Talvez o célebre historiador paulista tenha sido
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influenciado pela interpretação saquarema do conservador mineiro Firmino Ro-
drigues Silva3, mas o fato é que seu diagnóstico mostra-se bastante eficaz para
compreender a política de então, que lentamente deixa de ser assunto de bastido-
res para se constituir em uma verdadeira política de partidos. Mas este processo
de longa duração conviveu, entre 1808 e 1848, com a sombra e a influência per-
manentes da ação de validos atuando nos meandros da vida política imperial,
enquanto se formavam as duas principais legendas partidárias do período.
Ainda está para ser escrita a história do valimento no Império brasileiro.
Embora existam algumas obras de caráter mais geral e descritivo4, não houve,
por parte da historiografia recente, o interesse em se analisar a vida e o quotidi-
ano dentro da corte ao longo do século XIX – um centro de poder e de decisão –
, particularmente daqueles indivíduos que detinham o privilégio de compartilhar
do dia-a-dia no Palácio de São Cristóvão, integrando a nobreza palaciana. O
valimento é um fenômeno político imprescindível para se conhecer a elite e as
relações de poder no Brasil durante o oitocentos, algo que até agora pouco inte-
ressou à historiografia. Segundo Ricardo de Oliveira,
no âmbito da cultura política do Antigo Regime, perceber que
a problemática dos afetos e das relações de amizade, como
elementos inerentes aos códigos culturais daquela socieda-
de, possuía sentidos e dimensões específicas (...) [e] a possi-
bilidade ou não de ter acesso direto ao núcleo do poder ou
mesmo de se ter êxito na tentativa de alcançar certa mobilida-
de social ascensional derivava, em larga medida, da qualidade
das relações que cada aspirante possuía. Nessa sociedade, a
lógica e o princípio do mérito pouco ou nada valiam, ser amigo
de alguém poderoso e, mais do que tudo, ser amigo do rei
tornava-se o elemento decisivo para qualquer trajetória soci-
al. O valido era, portanto, alguém que, através de lutas e dis-
putas inerentes ao universo da corte, conseguia galgar posi-
ções e ocupar a centralidade do afeto régio, monopolizando o
amor, a amizade e a graça5.
Foi na corte do rei James II na Inglaterra que os palacianos foram denomi-
nados áulicos e de lá o termo incorporou-se ao universo e ao vocabulário político
no Império do Brasil6. Na linguagem política da época o conceito assumia uma
conotação negativa, pois, áulico seria um súdito singular que vive sob a proteção
e o patrocínio do monarca. Tanto no caso inglês quanto no brasileiro alguns des-
ses palacianos podiam residir no próprio palácio do monarca. Em seu prenúncio
durante o período joanino tais personagens e suas famílias foram inicialmente
agraciados com as melhores casas, cedidas para abrigar a corte. Também man-
tiveram o direito de ocupar espaços dentro do Palácio imperial7, dando-se a im-
pressão de que eram como que os olhos e os ouvidos do imperador. E na sociabi-
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Palacianos e aulicismo no Segundo Reinado – a facção áulica de Aureliano Coutinho
e os bastidores da corte de D. Pedro II
lidade brasileira de então, estar sob o mesmo teto, assumia foros de ser da pró-
pria família.
Os conselheiros de Estado eram também chamados áulicos naquele tem-
po. Vez ou outra, na imprensa também era comum o uso desta alcunha para
homens que pareciam ter a proteção de D. Pedro II. Para ser áulico era preciso
ser palaciano, ou seja, ter valimento, título de nobreza e freqüentar a corte. Mas,
a denúncia feita em 1847 de que Aureliano Coutinho de Oliveira liderava um
grupo que agia nos bastidores do governo imperial manipulando D. Pedro II e
interferindo na formação e dissolução dos gabinetes fez com que o termo áulico
passasse a se referir exclusivamente ao grupo de Aureliano, ou seja, à facção
áulica. A partir de então palaciano era quem vivia na corte, áulicos os integrantes
da facção áulica e nobre era todo aquele detentor de título de nobreza. Todos os
áulicos da facção eram palacianos, mas nem todos eram nobres e a alcunha teve
seu teor pejorativo potencializado: eram vistos como interesseiros, aduladores e
ambiciosos que se valiam da proximidade do monarca para angariar vantagens8,
que se encarregavam de espalhar mexericos e que, invariavelmente, provoca-
vam a instabilidade do regime ou levavam ao descrédito alguma reputação.
No exterior como no Brasil, a intimidade com a Coroa colocava os palaci-
anos como mediadores no caminho de todo aquele que almejasse a simpatia do
imperador e de sua família. E também que desejasse a nomeação para algum
cargo, posto ou função, para si e para outrem nos quadros da administração im-
perial e ou provincial. Mediação quase sempre necessária, que tanto mais pode-
ria ser facilitada, caso atingisse a benquerença dos homens que privavam do
convívio junto à D. João VI, depois junto à D. Pedro I e, por fim, a D. Pedro II.
Por isso, não poucos viam os palacianos como um grupo cuja interposição era
repudiada. Para não se sujeitar a isto, alguns preferiam não auferir títulos nobili-
árquicos, embora muitos daqueles que os possuíssem não fazer questão de fre-
qüentar a corte ou de mimosear o imperador. Em alguns casos até se depreende
uma viva atitude de desprezo aos rígidos protocolos do interior da nobreza por
parte de algumas expressões políticas. Ao longo da história do Império não foi
sem escândalo que muitos enxergavam o ritual do beija-mão, ou ainda censura-
vam os demasiados gastos com a manutenção da família imperial. A falta de
pompa na corte de D. Pedro II pode ter exacerbado a imagem renitente na histo-
riografia do caráter figurativo da corte e da nobreza brasileira.
A NOBREZA DA TERRA E A CORTE
Em livro recente, Maria Beatriz Nizza da Silva analisou o processo de no-
bilitação na colônia. Ela evidencia que no Brasil havia especificidades e que não
ocorreu, como em Portugal um processo de reprodução social da nobreza. Aqui,

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