Pelo menos a palmeira jussara, a euterpe edulis, evolui

Leio artigo de Fernando Reinach, no Estadão, dando conta de que a palmeira jussara, em face do desaparecimento dos animais de bico grande (principalmente os tucanos), vem produzindo frutos menores, para que estes possam ser devorados pelas aves menores e, assim, espalharem suas sementes para longe de seus próprios caules. A natureza é incrível, não? Em face das adversidades, ela mesma se renova, buscando a sobrevivência. Ou seja, até os vegetais evoluem. Melhor dizendo, ainda: não são os tucanos que, ameaçados em sua sobrevivência, buscam adaptação... Por eles, a espécie pode se explodir. Estão pouco se lixando. Quem os salvará é a euterpe edulis.

A proliferação dos predadores

Pois olhando para o nosso ecossistema administrativo-financeiro-ético-moral-jurídico de terrae brasilis, é possível observar que o aumento de predadores não produziu uma evolução à altura da preservação da própria espécie, quer dizer, o Estado. A proliferação de predadores da coisa pública deveria levar o “sistema” a produzir anticorpos (ou imitar o porco-espinho, que produziu uma bela camada protetiva contra os seus predadores). Isso seria, digamos assim, natural. Vejamos: qual é a diferença dos vigaristas e proxenetas de verbas públicas da Alemanha e de Pindorama? O Brasil teria tido azar em ter em sua “mata nativa” predadores do dinheiro público mais espertos e mais operosos que os habitantes das “matas” tedescas?

Para mim, a diferença está nos predadores dos predadores, isto é, o problema reside no fato de os predadores de primeiro nível — aqueles que predam o ervanário da viúva (nos três níveis de viuvidade: federal, estadual e municipal) — não encontrarem os seus predadores. Sendo mais claro: aqueles que, do lado de cá do ecossistema, têm a função de predar os predadores, não estão predando adequadamente. E quando faltam predadores dos predadores, cria-se uma anomalia sistêmica. Algo como ocorreu no interior do Rio Grande do Sul: os fazendeiros, descontentes com os caranchos que matavam filhotes de ovelhas, incentivaram o seu extermínio. Resultado: esqueceram que a sobremesa dos caranchos eram os ovinhos das caturritas, que, livres do predador, multiplicaram-se a tal ponto que tiveram que fazer campanhas de extermínio das pequenas aves verdes que dizimavam as plantações. Então: na Alemanha, preserva-se o carancho, porque ele salva as plantações... Por exemplo, o pai de Stefe Graff sonegou “grossos” impostos. Foi pego no aeroporto e jogado no ergástulo da cidade. Vejam: meus livros e artigos são um álibi a meu favor. Não precisaria dizer que não estou achando “bonito” que o pai da tenista vá para a prisão ou que o zagueiro Breno, do multimilionário Bayern de Munich (que lá cumpre pena por colocar fogo na própria casa) se lasque. As prisões brasileiras são a piores do mundo etc., etc. Ser ou não ser a favor de mais duras punições não parece ser o cerne da discussão. O cerne da discussão parece ser a “questão da impunidade”. E nisso somos craques.

O ecossistema autofágico

Por isso, quero falar da não-evolução-do-nosso-ecossistema... Isto é, quero relembrar que certa espécie de predadores voa livre e solta. E os dentes do predador “do bem”, isto é, dos mocinhos (chamemo-los assim), já de há muito são apenas um conjunto de restos de meio-caninos repletos de buracos de cáries. Some-se a esse desdentado predador uma fábrica de gambiarras e, bingo: eis aí o que está aí. É o que a casa oferece.

Por isso, o escândalo dos trens de São Paulo, o chamado “Trensalão”, só vem à tona por um azar histórico, ou seja, a Siemens ter dado com a língua nos dentes (ou algo assim). E “deu no New York Times”, isto é, se não sai na imprensa, o fato não existe. Como é possível que essa cartelização nas licitações envolvendo tanta “gente boa” tenha ficado velada por tanto tempo? Mas essa gente não declara Imposto de Renda? Como vivem os proprietários das empresas “carteleiras”? E para quem eles pagaram propina? É tudo dinheiro “não lavado”? Mas como circulou?

Para entender tudo isso, sugiro a leitura do livro A Especulação Imobiliária, de Italo Calvino. Em...

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