Princípios Orientadores dos Juizados Especiais

AutorOriana Piske
CargoJuíza de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT)
Páginas20-25

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1. Efetividade

As diretrizes constantes do artigo 2o da Lei 9.099/95 são lentes pelas quais os operadores do direito devem observar todas as disposições desse microssistema jurídico - os juizados especiais.

É fundamental notar o alcance dos princípios da efetividade, orali-dade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade em face dos objetivos traçados pela Lei dos Juizados Especiais.

A efetividade do processo apresenta-se como terminologia usada para dar a noção de que o processo deve ser instrumento apto para resolver o litígio1.

Não é segredo que o tempo é grande inimigo daquele que busca a reparação ou a proteção de seu direito. Diante de tanta burocracia geradora de dilações temporais, o jurisdicionado requer efetividade e rapidez processual. Isto leva a re-fletir sobre a justiça que está sendo operada por juizes e tribunais, os quais proferem muitas vezes decisões ideais distantes da percepção dos jurisdicionados e, ante um sistema recursal tão pródigo, não é in-comum, ao tempo da decisão final, o vencedor da demanda não mais estar vivo para ver tal decisão. O processo há de ter um tempo razoável de duração, o qual certamente não é o atual, na justiça tradicional.

Uma justiça demorada é causa, também, do difícil acesso do cidadão à prestação jurisdicional. A Convenção Européia para Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais diz isso expressamente no § Io do artigo 6° "(...) a Justiça que não cumpre suas funções dentro de um prazo razoável é, para muitas pessoas, uma Justiça inacessível"2.

Rui Barbosa discursando para seus afilhados, os bacharelandos de 1920 da Faculdade de São Paulo, lhes advertia:

"Mas justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito das partes, e, assim, as lesa no património, honra e liberdade. Os juízes tardinheiros são culpados, que a lassidão comum vai tolerando. Mas sua culpa tresdobra com a terrível agravante de que o lesado não tem meio de reagir contra o delinquente poderoso, em cujas mãos jaz a sorte do litígio pendente.,,3

A tempestividade compreendida como sendo a utilidade da prestação jurisdicional para aquele que quis ver o seu direito salvaguardado, preocupa os estudiosos de todo o mundo, os quais buscam instrumentos novos para o combate da lentidão judiciária.

As mudanças estão tomando corpo e tentando reestruturar o sistema processual brasileiro. Nesse passo, a Lei 9.099/95 representa instrumento de efetividade na solução das demandas.

Em sentido oposto a esta visão, Ricardo Rodrigues Gama entende que "os Juizados Especiais surgiram com o propósito de desafogar o Judiciário do enorme número de processos e dar acesso à Justiça para a população pobre. Em muitos Estados da federação, os Juizados Especiais não resol-

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veram muita coisa, para não dizer nada. Na verdade, o funcionamento desses Juizados só mostrou que existia e continua a existir muitos brasileiros que não resolvem os seus conflitos na guarida do Judiciário"4 Contudo, não apresenta dados empíricos que fundamentem esta opinião.

É fundamental abrir o Poder Judiciário ao cidadão. A justiça deve deixar de ser elitista, hermética e excessivamente técnica. Todos devem ter a proteção do juiz, guardião dos direitos fundamentais e dos direitos sociais do cidadão.

A Lei dos Juizados Especiais tem como princípio maior o da efetividade da justiça, mediante o acesso facilitado ao Judiciário. A efetividade apresenta-se como um princípio implícito, decorrente dos demais destacados no artigo 2° da Lei 9.099/95 (oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade), a ser perseguido por todos os operadores do direito visando à maior eficiência e à concreção dos direitos de cidadania.

O princípio da efetividade permeia a Lei dos Juizados Especiais como uma diretriz que, em conjunto com os demais princípios, norteia a interpretação da norma a ser balizada frente ao caso concreto. Trata-se de preceito jurídico. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, o princípio jurídico tem na sua essência o "mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tónica e lhe dá sentido harmônico"5.

Segundo Geraldo Ataliba, "mesmo no nível constitucional, há uma ordem que faz com que as regras tenham sua interpretação e eficácia condicionada pelos princípios. Estes se harmonizam, em função da hierarquia entre eles estabelecida, de modo a assegurar plena coerência interna ao sistema (a demonstração cabal disso está em J. M. Teran, Filosofia dei dere-cho, p. 146)"6.

Prossegue afirmando que "os princípios são as linhas mestras, os grandes nortes, as diretrizes para o provimento judicial ser efetivo não basta reconhecer na pretensão a existência do direito material lesado, determinando a recomposição das coisas ao seu status quo ante, conferindo à parte a mesma satisfação que teria pelo cumprimento voluntário, não fosse o descumpri-mento pelo devedor.

Uma vez que a jurisdição é a forma eleita para a solução das controvérsias, substituindo a pretérita autotutela, é mister que se revista de todos os meios necessários, em quantidade e qualidade, para que a parte obtenha a satisfação específica para a lide deduzida, de forma que alcance tudo que lhe seria outorgado se não houvesse a resistência do devedor.

Instrumentaliza-se a efetividade do processo, principalmente magnas do sistema jurídico"7.

Apontam os rumos a serem seguidos por toda sociedade e obrigatoriamente perseguidos pelos órgãos do governo (poderes constituídos).

"Eles expressam a substância última do querer popular, seus objetivos e desígnios, as linhas mestras da legislação, da administração e da jurisdição."8

Vale lembrar o conceito de Luis Roberto Barroso, no sentido de que "a efetividade significa, portanto, a realização do Direito, o desempenho concreto de sua função social. Ela representa a materialização, no mundo dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social"9. O princípio da efetividade do processo pressupõe o alcance de "um processo de resultados"10, ou seja, que haja instrumentos adequados à tutela dos direitos, com o escopo de salvaguardar ao máximo a utilidade das decisões. Portanto, a efetividade é aptidão para se alcançar os fins para os quais foi instituído.

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