A raça das bananas

Dorrit harazimDurante a campanha presidencial do ano passado, o candidato socialista François Hollande prometeu que, se eleito, excluiria a palavra "raça" da Constituição francesa. Explicava que só existe uma raça, a família humana.A coisa andou. Seis meses atrás, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que suprime as 59 referências a "raça" ou "racial" em algum texto legislativo. Justificativa: "A República Francesa não reconhece a existência de nenhuma presumida raça... [...] Convém suprimir o termo, que não tem nenhum valor científico e sobre o qual as ideologias racistas baseiam suas convicções [...]".O projeto de lei ainda precisará passar pelo Senado, ser promulgado e se adequar aos vários acordos internacionais dos quais a França é signatária. Quanto a banir a palavra do artigo I da Constituição, ninguém mais fala no assunto diante da montanha de problemas mais visíveis enfrentados pelo país.Um deles é a cena ocorrida duas semanas atrás, durante a passagem pela cidade de Angers de uma autoridade de peso, a ministra da Justiça. Na República Francesa, quem ocupa esse cargo ainda é referido pelo título monárquico de Garde des Sceaux. Christiane Taubira, franzina na aparência, nasceu em Caiena 61 anos atrás. Foi tenaz o suficiente para fazer a suada travessia da Guiana Francesa ao centro do poder político em Paris.Desde que assumiu o cargo, no entanto, ela polariza a sociedade e suscita ódios intensos devido ao decisivo empurrão que deu para a aprovação do casamento homossexual. Mas não só por isso. Christiane Taubira é negra.Na tarde de 25 de outubro, ela foi recepcionada por uma passeata contra a união gay. Já está acostumada. O protesto de Angers era tão "família" que sequer exigiu grande aparato policial: os manifestantes não chegavam a uma centena, a maioria pais e mães acompanhados de filhos em idade escolar.À aproximação da ministra, palavras de ordem brotaram com naturalidade e empolgaram a criançada: "Macaca, vá comer tua banana", "Taubira, você fede". Em determinado momento, incentivada pelos adultos, uma pré-adolescente de 12 anos, mochila nas costas, conseguiu pegar uma casca de banana das mãos de um menino de sua idade e se pôs a balançá-la na direção da Garde des Sceaux. De algum ponto saiu a pergunta: "E para quem é a banana?" A resposta veio em coro, na ponta da língua: "Para a macaca."Christiane Taubira é cidadã do mesmo país daquelas famílias - a Guiana onde nasceu não é colônia nem terra estrangeira, constitucionalmente faz...

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