'Relação entre EUA e Rússia é tão ruim quanto no fim da guerra'

Entrevista concedida pela ex-consultora da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) Angela Stente ao jornalista Luís Fernando Silva Pinto, para o programa Milênio, da Globo News. A entrevista foi concedida e veiculada no programa antes do dia 17 de março, quando a Crimeia fez um referendo que aprovou com 96,8% dos votos a adesão da região à Federação Russa. O Milênio é um programa de entrevistas, que vai ao ar pelo canal de televisão por assinatura Globo News às 23h30 de segunda-feira.

A crise na Ucrânia deixou as relações entre Rússia e Estados Unidos em níveis de tensão parecidos com o da Guerra Fria. A ocupação militar russa da Crimeia após uma revolta popular que tomou as ruas de Kiev contra o governo de Viktor Yanukovych, por causa de um cancelamento de um acordo com a união europeia levou os Estados Unidos a ameaçarem os russos com sanções e levou Moscou a considerar retaliações contra os americanos. Enquanto isso, a Ucrânia, peça chave para a distribuição de gás para a Europa, está a beira da falência e dividida politicamente. Mas as disputas entre Estados Unidos e Rússia tem raízes mais antigas, desde a dissolução da União Soviética, em dezembro de 1991, os dois países interpretam a realidade de formas opostas. Para os Estados Unidos a década de 90 foi um renascimento para as liberdades e da democracia na Rússia. Para os russos, os anos 90 foram uma década de pobreza e humilhação, vendo os americanos tomarem decisões unilaterais mesmo na vizinhança da Rússia, como aconteceu na Sérvia. A situação da Ucrânia hoje mostra uma inversão de papeis: Moscou toma as decisões. Washington, só pode reagir. Nesse contexto, o livro da professora Angela Stente não poderia ser mais atual, dedica 355 páginas ao exame de um só tema: os limites da parceria e a mecânica da rivalidade entre Estados Unidos e Rússia. Especialista nas relações entre Estados Unidos, Rússia e Europa, Stente já serviu ao governo americano no departamento de estado, foi consultora da Otan e hoje ocupa o cargo de diretora do centro para estudos eurasianos russos e do leste europeu, e é professora de governo e diplomacia da Universidade de George Town.

Luís Fernando Silva Pinto — O título do seu livro é: os limites da parceria na relação entre Estados Unidos e Rússia no Século XXI. Essa palavra limite parece ser central. Por quê?

Angela Stente — Porque desde o colapso da União Soviética e do fim da Guerra Fria com certeza os Estados Unidos — e acho que no inicio a Rússia também — estava tentando tornar a relação mais produtiva, que fosse além da animosidade, da hostilidade e das desconfianças da Guerra Fria. Isso foi muito difícil de fazer, porque ficou claro, quando você olha para os últimos 22 anos, que ambos os lados têm uma visão diferente do que está relação melhor seria. O principal é isso: vemos o mundo de maneira diferente e discordamos sobre o que uma boa parceira seria.

Luís Fernando Silva Pinto — Bem, o exemplo está presente na Ucrânia, na Crimeia — tensão é o nome do jogo — como você vê essa situação?

Angela Stente — O que aconteceu agora na Ucrânia é, de certa forma, o clímax de uma das políticas que Vladimir Putin tem perseguido desde que subiu ao poder que é tornar a Rússia uma grande potência novamente e garantir que a Rússia mantenha uma esfera de influência sobre os antigos Estados soviéticos, particularmente, a Ucrânia tem sido a questão mais nevrálgica. Como eu falo no meu livro, há 10 anos, durante a revolução Laranja, o Kremlin estava convencido que os Estados Unidos e os Europeus estavam tentando derrubar um governo pró-russo lá e colocar um governo pró-ocidente e que isso seria o primeiro passo para fazerem isso na Rússia também. Então, para a Rússia, a Ucrânia tem dois aspectos: na política externa é a escolha da Ucrânia entre o Ocidente e a Rússia e, no plano...

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