\'Ásia requer mais atenção dos EUA do que Oriente Médio\'


Entrevista concedida pelo diplomata Richard Haas, editor-executivo da revista Foreign Affairs, ao jornalista Lucas Mendes, para o programa Milênio , da Globo News . O Milênio é um programa de entrevistas, que vai ao ar pelo canal de televisão por assinatura Globo News às 23h30 de segunda-feira, com repetições às 3h30, 11h30 e 17h30.



O Plano Marshall recuperou a economia europeia e as ajudas econômica, militar e humanitária se tornaram componentes importantes da política externa americana. E elas cresceram com John Kennedy e a criação do Banco de Desenvolvimento Internacional e outros programas. O congresso passou leis para controlar os poderes do executivo nas ações internacionais e a lei americana proíbe, por exemplo, qualquer tipo de ajuda a quem depõe um regime eleito democraticamente. Isto não impediu que Nixon apoiasse ditaduras no mundo inteiro, nem que o presidente Carter, que colocou os direitos humanos no coração da política externa americana deixasse de apoiar o ditador do Zaire. Desde 2001, com o início da guerra ao terror, as invasões mal sucedidas do Iraque e Afeganistão, os revertérios na Primavera Árabe, a política externa americana, agravada pela crise econômica de 2008, ficou à deriva, segundo Richard Haas. Há dez anos ele é o presidente do Council on Foreign Relations e editor-executivo da revista Foreign Affairs, que acaba de fazer 50 anos. O conselho nem sempre é obedecido, mas suas recomendações sempre chegam aos ouvidos de quem decide política externa.


Lucas Mendes — Você diz que o século XXI parece estar indo muito bem, pois não parece haver possibilidade de uma grande guerra. Podemos dizer que ele está melhor do que os últimos 500 anos? Isso é algo muito bom. Nos últimos cinco séculos, houve guerras o tempo todo.

Richard Haas — Parece bom nesse sentido. Você tem razão. Pode-se dizer que a Idade Moderna começou na metade do século XVII. Há quem considere como início a Paz de Vestfalia, em 1648. E, se analisarmos os últimos três a quatro séculos desde então, veremos que a principal característica das relações internacionais foi a competição, que levou, muitas vezes, a conflitos entre as maiores potências da época. E assim foi até o século passado: A I Guerra Mundial, a II Guerra Mundial, a Guerra Fria foi terrível. Tivemos esses três grandes conflitos, e, se você analisar o número de vidas perdidas e de recursos que foram consumidos, verá que o século passado foi o mais destrutivo da história registrada da humanidade. O que este século XXI tem de tão interessante? É que essa não é a dinâmica principal, a característica principal das relações internacionais. Além dos EUA, há uma série de outras grandes potências: China, Índia, Japão, União Europeia, Rússia, Brasil, além de outras. As relações entre elas não são perfeitas. Não somos necessariamente aliados ou melhores amigos, não concordamos em tudo, mas nossas diferenças são limitadas. Assim temos relações em que concordamos em algumas questões, cooperamos em algumas áreas e podemos discordar em outras, mas essas diferenças não são profundas. Elas não são do tipo de diferença que leva ao conflito. Não estou aqui dizendo que não existam problemas, é óbvio que existem.


Lucas Mendes — E era aonde eu ia chegar. Para bagunçar esse ótimo futuro, temos um Irã nuclear, um Paquistão fraco e uma Coreia do Norte imprevisível. Quais são as melhores e as piores possibilidades para cada um deles?

Richard Haas — Você identificou um conjunto de problemas, que podemos chamar de países intermediários. O pior que poderia acontecer com a Coreia do Norte seria o país, de alguma forma, dar início a uma guerra com a Coreia do Sul ou começar a vender, como já fez no passado, mísseis ou tecnologia nuclear. Outra possibilidade seria o colapso da Coreia do Norte, o que causaria algum tipo de guerra na península. Seria o pior. O melhor que poderia acontecer seria uma reforma da Coreia do Norte, com a China sendo persuadida a seguir na mesma direção, e a reunificação pacífica da Península da Coreia.


Lucas Mendes — Quem está contrário à reunificação?

Richard Haas — A Coreia do Norte, obviamente.


Lucas Mendes — Mas das grandes potências?

Richard Haas — A China tem resistido muito. A China teme muito que uma Coreia unificada possa contribuir para o cerco da China, estrategicamente falando, e ficar, de alguma forma, do lado americano, porque, com a reunificação, o centro da Coreia seria Seul, e não Pyongyang. Isso preocupa a China. Por incrível que pareça, algumas pessoas da Coreia do Sul se preocupam com uma reunificação, por causa do custo econômico dela. Os desafios do Irã nuclear são enormes. O mundo poderia ter que decidir se quer conviver com um Irã detentor de armas nucleares, o que eu considero desestabilizador.


Lucas Mendes — Por quê?

Richard Haas — Bem, outros países também iriam querer ter...

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