O tempo de uma nova comunidade

Carla RodriguesEspecial para O GLOBOprosaeverso@oglobo.com.brPoder e exceção. Conceitos do filósofo italiano Giorgio Agamben (ao lado) podem iluminar debates sobre casos como as manifestações no Brasil (acima) e a morte de Jean Charles pela polícia britânica (à direita)Fabio Seixo/5-7-2013Ulf Andersen/Getty Images/30-1-2001EFE/Fernando Mañoso/25-7-2005símbolo de uma renovação filosófica do século XXI"Oque mais impressiona nas manifestações (...) é, de fato, a relativa ausência de conteúdos determinados de reivindicação...". Em elaborações mais ou menos parecidas, algumas vezes acompanhadas de expressões de perplexidade como "afinal, o que querem os manifestantes?", frases como esta foram repetidas exaustivamente desde que as revoltas de junho começaram, espalhando pelas ruas do país milhares de manifestantes em torno de pautas de reivindicação difusas - como em tantos outros protestos de rua que eclodiram nos últimos dois meses - ou com demandas específicas, como as do Movimento Passe Livre. A frase completa, no entanto, é do filósofo Giorgio Agamben, se refere aos protestos da Praça da Paz Celestial, e está publicada em "A comunidade que vem", lançado na Itália em 1990.Quem chama atenção para a semelhança entre o Brasil do século XXI e o que Agamben pensa sobre a China de 1989 é Cláudio Oliveira, professor do departamento de Filosofia da Universidade Federal Fluminense (UFF), coordenador da coleção Filô Agamben e tradutor do livro, lançamento da Autêntica e um dos três títulos do autor que estão chegando às livrarias por editoras diferentes, indicando o interesse e a atualidade do pensador italiano (ver box).Atualidade que é a marca de um filósofo difícil de ser enquadrado nas concepções tradicionais de filosofia, dividida classicamente entre antiga, medieval, moderna e contemporânea, onde ele, nascido em 1942 deveria se situar. Mas como suas influências principais já são de autores contemporâneos, como Martin Heidegger, Walter Benjamin, Michel Foucault, Jacques Derrida e Hannah Arendt - onde se pode localizar muito da sua influência para pensar a política - Agamben acaba sendo símbolo de uma renovação filosófica do século XXI.Em "A comunidade que vem", Agamben pensa sobre aquilo que, até recentemente, não parecia ser um modo político de pensar uma comunidade: não fundada em ideais de identidade e universalidade. Com as manifestações de junho, a rejeição a instituições políticas como partidos ou sindicatos, a "comunidade que vem" se torna uma chave para...

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