Inquisição tropical

Estudo derruba ideia de que perseguição foi pequena no brasil e revela que santo ofício criou "elite" de delatoresMarcelle Ribeiromarcelle@sp.oglobo.com.brSÃO PAULOHavia apenas dois anos que Antonio Gonçalves Pereira, mercador de secos e molhados de Minas Gerais, tinha começado a usar casaca, peruca e espadim, quando tentou fazer parte do quadro de "funcionários" da Inquisição no Brasil. Filho de lavradores do Norte de Portugal, ele conseguiu mudar de vida em terras brasileiras com o comércio em Minas e tinha, em 1755, "boas casas". Mas faltava-lhe destaque na sociedade e prestígio. Em busca de status, candidatou-se a um cargo civil no Santo Ofício, conquistado depois de três anos de um processo de apuração sobre suas origens. Com o título de "Familiar do Santo Ofício", estava apto a investigar o passado de quem queria um cargo na Inquisição e a prender os suspeitos de "heresia", acusados de fazer pacto com o demônio e ter outra fé que não a cristã.Pereira foi um dos 1.907 civis - não clérigos - que foram empossados no cargo de "familiar" da Inquisição entre 1713 e 1785 no Brasil, atraídos principalmente pelo status que a função proporcionava, segundo o pós-doutorando em História da Universidade de Campinas (Unicamp) Aldair Carlos Rodrigues.Em sua premiada tese de doutorado na Universidade de São Paulo (USP), intitulada "Poder eclesiástico e Inquisição no século XVIII luso-brasileiro: agentes, carreiras e mecanismos de promoção social", Rodrigues revela um lado menos conhecido da Inquisição: o dos brasileiros que queriam trabalhar para o Santo Ofício. E mostra que, diferentemente do que muitos livros didáticos ensinam, a Inquisição esteve, sim, muito presente no Brasil.- A Inquisição foi muito importante para a formação da elite colonial no Brasil. Os novos ricos pressionavam para entrar na Inquisição, pois era uma forma de ascender socialmente - diz Rodrigues, cuja tese recebeu os prêmios Capes 2013 e Grande Prêmio Capes Tese Darcy Ribeiro, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação.Atestado de "sangue puro"Ter um cargo na Inquisição significava ter um dos atributos mais desejados na época: um atestado de que seu sangue era "puro", ou seja, que a pessoa não pertencia a raças consideradas "infectas" pelo Santo Ofício, como judeus (inclusive os recém-convertidos), muçulmanos, negros e indígenas.A perseguição da Inquisição na Península Ibérica a pessoas de outras religiões tem relação com a ocupação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT